A exposição a ecrãs e a utilização de redes sociais em idade pediátrica foi o tema em destaque no programa de fevereiro da Rádio Telefonia do Alentejo (RTA), feito em parceria com a Unidade de Saúde Pública (USP) do Alentejo Central.

Esta conversa dedicada à saúde e aos tempos de ecrãs, sobretudo em relação às crianças e jovens, contou com a participação da médica interna em Saúde Pública (SP), Beatriz de Aranha, e o médico interno em Formação Geral (FG), Eduardo Santa.

Segundo Eduardo Santa, “existe cada vez mais evidência científica disponível que aponta para riscos consideráveis associados ao uso indevido dos ecrãs e tecnologias digitais ao longo das várias etapas da idade pediátrica, que vai dos 0 aos 18 anos, e até mesmo na vida adulta”.

Alertou que “o uso indevido de tecnologia digital acontece sobretudo em idade pediátrica e consiste na exposição prolongada a ecrãs e conteúdo digital selecionado de forma autónoma e aleatória pela própria criança ou adolescente, sem supervisão por parte de um adulto e sem filtros de segurança”, apontando que isso “traduz-se na visualização de conteúdos pouco didáticos, inapropriados à idade, muitas vezes, com excesso de violência e por longos períodos de tempo”.

A este respeito, Beatriz de Aranha recordou que “a palavra ecrãs abrange não só as televisões e os computadores, mas também os telemóveis, tablets e playstations”, salientando que “estar muito tempo a olhar para ecrãs tem riscos de saúde, desde o aparecimento da miopia em idades mais precoces até ao aumento dos níveis de sedentarismo e ao impacto negativo na nossa saúde mental”

Eduardo Santa acrescentou que, “atendendo que nos primeiros anos de vida há uma maturação do sistema nervoso, ou seja, uma fase muito importante do desenvolvimento do nosso cérebro, a Saúde Pública tem manifestado preocupações com a exposição precoce e o uso indevido destas tecnologias, sobretudo pelo seu impacto na saúde da criança e no neurodesenvolvimento”.

Deu ainda conta de que “a exposição à tecnologia digital é nociva particularmente pelo facto destes dispositivos estarem sempre disponíveis, mesmo fora de casa; terem a capacidade de provocar vício; e serem usados para gerir birras, evitando os momentos de pausa e de tédio, uma vez que possibilitam que a criança esteja constantemente em busca de um novo estímulo ou recompensa”.

A par disso, o médico interno em FG adiantou que “compreendem ainda outros riscos porque as crianças e jovens estão sujeitas a conteúdos pouco didáticos ou são confrontados com conteúdos inapropriados, de violência, de incitação ao ódio e à discriminação e até conteúdos de teor sexual, tornando-se mais vulneráveis à divulgação de dados pessoais, ao cyberbullying, à desinformação ou à perda de noção da fronteira entre o real e o virtual”.

Relativamente ao tempo de uso, Beatriz de Aranha especificou que “os especialistas recomendam que as crianças até aos 3 anos não usem ecrãs, podendo haver a exceção das videochamadas e um pouco de televisão, sempre na presença de adultos e com programas didáticos”.

Realçou que “dos 4 aos 6 anos o tempo seria de até meia hora, sempre com conteúdos selecionados e evitando usar os ecrãs para controlar birras ou para que a criança não se aborreça”.

De acordo com a médica interna em SP, “a partir dos 7 já é possível dar gradualmente mais liberdade às crianças na uso dos ecrãs, mas o ideal seria até aos 11 anos limitar o tempo de exposição a uma hora por dia”, focando que “entre os 12 e os 15 anos até 2 horas por dia, enquanto dos 16 aos 18 tentar limitar a utilização de ecrãs a 2 a 3 horas por dia”.

Para Eduardo Santa, “a educação em casa é fundamental na aquisição de comportamentos saudáveis em relação ao uso destas tecnologias”, considerando que “os pais devem servir de exemplo no equilíbrio entre o uso de dispositivos e a execução de outras atividades, devem promover o sentido crítico em relação à informação, devem fomentar a visualização de conteúdos de qualidade e discutir com os filhos o risco de partilha de dados pessoais”.

Relativamente às escolas, sustentou que “podem ser ponderadas restrições à utilização de telemóveis e outros ecrãs nos intervalos escolares, por exemplo”.

Questionado sobre como pode a Saúde Pública contribuir nesta área, o médico interno de FG explicou que “através da recolha e monitorização de dados da utilização de dispositivos digitais tem a competência para elaborar políticas de saúde que visam a limitação do acesso a estas tecnologias e o tempo de ecrãs nas crianças, e mesmo na população adulta, tanto no meio familiar como no meio escolar”.

Entre outras ações, exemplificou que, “perante a dependência digital que se verifica entre os mais novos, deve apoiar o desenvolvimento e a implementação de um currículo de literacia digital nas escolas, bem como promover ações de prevenção e de educação para toda a população”.

Texto: Redação DS / Marina Pardal
Foto: DS